É comum associarmos a rede de balanço à momentos ou ambientes de lazer e descanso. No entanto, sua presença imemorial em nosso cotidiano nos leva à uma série de desdobramentos sobre a nossa história, a ressignificação de artefatos indígenas e a nossa identidade cultural.
Para o historiador e antropólogo Câmara Cascudo, baseado em Natal e dedicado ao estudo da cultura brasileira, elementos de uso cotidiano tal qual a rede de descanso são dignos de cuidado e observação, uma vez que são extremamente importantes para a ciência etnográfica a fim de investigar peculiaridades de nossa cultura. Há que se valorizar sua relevância histórica e seu utilitarismo funcional.
Em suas palavras no livro “Rede de dormir: uma pesquisa etnográfica” (2003), Câmara Cascudo define a rede como algo que toma o nosso feitio, contamina-se com os nossos hábitos e repete, dócil e macia, a forma do nosso corpo. Para adiante complementar seu posicionamento com o mesmo viés poético ao dizer que “a rede é acolhedora, compreensiva, coleante, acompanhando, tépida e brandamente, todos os caprichos da nossa fadiga e as novidades imprevistas do nosso sossego.”
A rede representa nossa identidade cultural. Foto: El Mueble | Reprodução
O primeiro registro da existência da rede em português é datado em 27 de abril de 1500, na carta de Pero Vaz de Caminha ao rei D. Manoel, entre os relatos sobre as terras que viriam a ser o Brasil e os costumes dos nativos, destacando a ausência de móveis como cama e o uso da rede para dormir - assim nomeada em comparação à estrutura de malha (trançada) da rede de pesca.
Já a representação da rede de descanso na arte figurativa transpareceu em 1551 com a gravura intitulada “Fête brésilienne” de artista desconhecido, abrindo oportunidade para pesquisadores como André Thevet, Hans Staden, Jean de Lery, Karl von den Steinen e Debret manifestarem suas interpretações acerca deste elemento iconográfico tão emblemático nas representações artísticas sobre o Brasil Colônia.
A rede é um genuíno artesanato brasileiro constituído de fios torcidos de algodão. E, antes de proporcionar o deleite na decoração de interiores, foi essencial na cultura indígena onde era chamada de “ini”, que em tupi-guarani significa “linha”, “fio” ou “aquilo em que se dorme”. Entre as explicações consideráveis sobre o desenvolvimento da estrutura pelos povos ameríndios está o fato do trabalho entrelaçado com fibras naturais impedir o acesso de alguns insetos favorecendo o descanso.
É um artesanato apropriado da arte indígena “ini”. Foto: Margo Hupert | Reprodução
Se em suas origens as redes de balanço configuraram assento para refeições, encosto para sesta, cama para o sono e condução para o leito de morte, já que os índios nelas “nasciam, viviam, amavam e morriam”, na atualidade emprestam suas formas, tramas e cores emolduradas por varandas para acalentar ambientes internos e externos, acolher enquanto desfruta leituras (como esta) ou embalar e relaxar o corpo no momento em que a brisa invade a sacada.
Ainda na visão de Câmara Cascudo, a rede colabora na movimentação dos sonhos e concede aos bebês o gesto afetivo de ninar ao embalá-los sem o menor esforço. Não obstante, há redes de descanso para berço cujo conforto e o movimento rítmico proporcionam acolhimento para o bebê e o deixa mais calmo ao simular a posição em que fica no útero da mãe.
As peças mais conhecidas são as do nordeste brasileiro, as famosas redes cearenses, que mantém a qualidade e a tradição indígena de tessitura artesanal com fibras naturais. Junto à região norte são as maiores produtoras e exportadoras brasileiras de redes de dormir, dado corroborado pelo número elevado de artesãos e fábricas têxteis voltados à confecção.
A rede leva acolhimento para ambientes. Foto: Sf Girl | Reprodução
Embalar os melhores momentos em redes de descanso não proporciona apenas relaxamento, o contato com ela é mais profundo, exalta o que há de mais brasileiro nos costumes que subsistiram o tempo e que formam a nossa memória cultural.
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Namastê!
Milene Sousa - Arte & Sintonia